Doria demite diretora do Ilume após áudio indicar possível recebimento de propina de empresa vencedora de PPP
Brasil - Ações Públicas - Demissão/Corrupção
Denise Abreu conversa com secretária pessoal sobre repasse de dinheiro da FM Rodrigues. Ela também diz que dois secretários de Doria recebem propina da Eletropaulo.
Denise Abreu, diretora da Ilume, tem áudio revelado que revela recebimento de propina da vencedora da PPP da Iluminação (Foto: Michel Montefeltro/ G1)
A diretora do Departamento de Iluminação da Prefeitura de São Paulo (Ilume), Denise Abreu, foi exonerada nesta quarta-feira (21) após o vazamento de uma gravação indicar possível recebimento de propina do consórcio FM Rodrigues, vencedor da licitação da PPP (Parceria Público-Privada) da Iluminação Pública. Esse é o consórcio que já faz a manutenção da iluminação da cidade através de um contrato emergencial com a Prefeitura.
Em nota, o prefeito João Doria diz que “determinou a instauração de procedimento investigatório pela Controladoria Geral do Município sobre as declarações veiculadas pela imprensa e sobre a regularidade do processo de seleção da Parceria Público Privada da Iluminação. O prefeito determinou ainda que CGM a auxilie o Ministério Público no que for necessário”, diz o texto.
No áudio, revelado pela rádio CBN, Denise Abreu conversa com sua secretaria em seu gabinete em dezembro do ano passado. Na conversa, Denise diz que irá realizar o último pagamento à secretaria no valor de R$ 3 mil referente ao mês de novembro. Segundo ela, o dinheiro foi repassado pela FM Rodrigues que deixaria de pagar o valor porque teria os contratos encerrados com a Prefeitura. A “mesada” da empresa seria paga em troca de favorecimento.
Denise também acusa os secretários Marcos Penido (Serviços e Obras) e Julio Semeghini (Governo) de receberem propina da Eletropaulo. Na gravação, ela diz que “tudo mundo sabe que eles levam uma 'bola' da Eletropaulo."
O G1 tentou falar com Denise Abreu, mas não conseguiu. Em nota, a diretora do Ilume "nega que tenha praticado qualquer irregularidade e afirma que vai esclarecer todas as acusações infundadas. Ressalta que não poderia interferir na PPP da Iluminação, pois não teve a participação na Comissão Especial de Licitação e nem competência legal para assinar contrato”, afirmou.
Já a Prefeitura de São Paulo informa que todas as ações da Comissão Especial de Licitação foram publicadas no Diário Oficial e que o consórcio Walks foi excluído do certame por ser integrado pela empresa Quaatro, controladora da Alumini, que foi declarada inidônea pelo Ministério da Transparência, o que a impede a participação de licitações e/ou firmar contratos nas três esferas do governo. "A Prefeitura ressalta que todo o processo da PPP da Iluminação foi pautado pelo respeito à lei e à transparência.”
Denise Abreu era diretora jurídica da Agência Nacional da Avião Civil (Anac) na época do acidente da TAM que deixou 199 mortos em 2007. Ela chegou a ser denunciada pelo Ministério Público na ocasião por responsabilidade no acidente, mas depois foi absolvida pela Justiça Federal.
Conversa
Veja abaixo a descrição do áudio divulgado:
DENISE ABREU - Eu vou te dar os seus três [R$ 3 mil]... Mas a empresa [FM Rodrigues] não tem mais contrato e eu não vou ter como arcar daqui pra frente com isso. É o último mês. Simplesmente não tem como.
SECRETÁRIA - Nem em dezembro?
DENISE ABREU - Tô te dando agora.
SECRETÁRIA - Então, [o pagamento] que era de novembro?
DENISE ABREU - Não tem como [pagar em dezembro]. Você não tá vendo os movimentos? E ninguém faz nada, querida. Entendeu?
SECRETÁRIA - Hum..
DENISE ABREU - É um escândalo o que tá acontecendo em São Paulo e não tem um jornalista para empurrar isso. Então, querida, dançou. Não tem mais PPP, não tem mais nada, pode esquecer. Não tem fonte. Não tem fonte.
SECRETÁRIA - Tá bom, doutora. Tudo bem.
Em outro momento da gravação, Denise Abreu diz que é inimiga de Walter Torre, dono da WTorre, integrante do consórcio Walks, e que a empresa não pode ganhar a PPP porque está na Lava Jato.
DENISE ABREU: eu não tenho nenhum contato, nem vou me mexer com a Walter Torre. Nem vou. Ao contrário. Eu sou inimiga deles.
SECRETÁRIA: Mas a PPP você não vai ganhar?
DENISE ABREU: Não. A PPP existem dois concorrentes.
SECRETÁRIA: Tá, me explica.
DENISE ABREU: FM Rodrigues e Walter Torre, que está na Lava Jato, denunciado [...] E com isso tudo nós estamos perdendo aqui [...] O Marcelo [Rodrigues, da FM Rodrigues] disse. 'Se eles são os santos, então vocês vão assinar [o contrato] com os santos. Eu estou partindo'. Ele tá de saco cheio, cara.
SECRETÁRIA: O senhor Marcelo?
DENISE ABREU: Opa! Especialmente da imprensa [...] Eles estão afundando, afundando a PPP.
SECRETÁRIA: Quem?
DENISE ABREU: A imprensa.
Em outra gravação, Denise acusa o secretário municipal de Serviços e Obras, Marcos Penido, e o secretário de Governo, Julio Semeghini, de receberem propina da Eletropaulo.
DENISE ABREU: "Por quê? Porque os que ganham propina da Eletropaulo devem estar já assim: "Ai meu Deus do céu ela falou do meu propineiro e agora? Penido, Julio Semeghini, tudo mundo sabe que eles levam uma 'bola' da Eletropaulo."
O contrato, de R$ 6,9 bilhões e com vigência de 20 anos, foi assinado com a Prefeitura no dia 8 deste mês. Em três anos, o consórcio se comprometeu em substituir 535.713 pontos de iluminação por LED, do total de 618.355 pontos.
PPP da Iluminação
Mesmo com uma proposta quase R$ 7 milhões mais cara do que a do concorrente, o Consórcio FM Rodrigues/CLD foi declarado o vencedor da licitação da PPP. Esse é o consórcio que já faz a manutenção da iluminação da cidade, por meio de contrato emergencial com a Prefeitura.
O FM Rodrigues venceu com a proposta de R$ 30.158.492,00. Mesmo com uma proposta melhor, de R$ 23.259.392,00, o Consórcio Walks, que também disputava a PPP, foi excluído do processo.
Segundo a Prefeitura, isso ocorre porque uma das empresas participantes do Consórcio Walks, a Quaatro, é controladora da Alumini, que é declarada inidônea pelo Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União. “Esta decisão impede a empresa de participar de licitações nas três esferas de governo”, diz nota da Secretaria Municipal de Serviços e Obras (SMSO).
O processo para a escolha da empresa começou em abril de 2015, quando o primeiro edital foi publicado. De lá para cá, ele apresentou falhas, foi republicado e os consórcios entraram com ações na Justiça.
Entenda o caso abaixo:
•O edital da concorrência para a PPP da Iluminação foi publicado no dia 23 de abril de 2015. Na época, o Tribunal de Contas do Município (TCM) suspendeu o processo por apresentar falhas;
•Em 13 de maio de 2015, a Prefeitura republicou o edital com as correções. Os envelopes de documentação foram abertos em 4 de fevereiro de 2016
•Na sequência, o TCM recebeu uma representação do Consórcio FM Rodrigues/CLD contra a habilitação do Consórcio Walks. A alegação era de que a documentação de garantia apresentada não cumpria todas as exigências do edital. O processo foi suspenso para análise;
•No dia 5 de julho de 2017, o TCM liberou a retomada do processo da PPP da iluminação. Os dois consórcios entraram com ações na Justiça, mas nenhuma manifestação ou decisão do Tribunal de Justiça teve efeito suspensivo;
•Mesmo com essa liberação do processo, a Prefeitura demorou para retomar o processo. Inclusive, remanejando verba para cobrir o Fundo de Iluminação Pública por causa do contrato emergencial com o Consórcio FM Rodrigues/CLD;
•Em novembro de 2017, o TCM questionou a Prefeitura perguntando o que a administração faria em relação a PPP da Iluminação: retomaria a licitação ou apresentaria outro modelo e solução
•No dia 31 de novembro passado, o TCM fez mais um questionamento à Prefeitura. Quis saber o motivo de a administração dar prioridade a um contrato emergencial em vez do processo legal, que já estava liberado. Na sequência, determinou uma auditoria na execução do contrato emergencial;
•Em janeiro deste ano, a Prefeitura retomou o processo;
•No dia 29 de janeiro, a Comissão de Licitação da PPP da Iluminação Pública abriu os envelopes das propostas comerciais. Foi classificado provisoriamente o consórcio Walks (formado pelas empresas WPR participações Ltda., Quaatro Participações S/A e KS Brasil LED Holding Ltda.), que apresentou valor mensal de operação e investimento na iluminação pública de R$ 23.259.392,00. O consórcio FM Rodrigues/CLD apresentou uma proposta de R$ 30.158.492,00;
•No dia 6 de fevereiro, a Prefeitura abriu os envelopes da habilitação técnica;
•Mesmo com uma proposta melhor, o consórcio Walks foi excluído do processo por ser integrado pela Quaatro, controladora da Alumini, uma empresa declarada inidônea pelo Ministério da Transparência, Fiscalização e Controladoria-Geral da União;
•O Consórcio Walks entrou com um recurso na Comissão de Licitação da PPP da Iluminação questionando a habilitação do consórcio FM Rodrigues/CLD, porque uma das empresas que fazem parte da sociedade responde a um processo por improbidade administrativa no município de Jaú;
•O recurso foi analisado pela Comissão de Licitação, que manteve o Consórcio FM Rodrigues/ CLD na disputa. Ela alegou que, mesmo com a ação de improbidade, a empresa não exerceu o direito constitucional ao contraditório e ampla defesa, e que o despacho do Tribunal de Justiça afasta absolvição liminar sob a premissa de que cabe ao Ministério Público provar o alegado na inicial no curso do processo;
•No dia 28 de fevereiro, a Comissão de Licitação declarou o Consórcio FM Rodrigues vencedor.
G1 /PH
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